Anac propõe novas regras de coordenação de slots

Anac propõe novas regras de coordenação de de slots

A Anac ampliou de 45 para 60 dias a consulta pública para receber contribuições sobre a nova regra de coordenação de slots (autorização de pouso e decolagem) em aeroportos com infraestrutura saturada. O prazo vale a partir da data de publicação no Diário Oficial da União, no dia 08/10/2021.
A proposta de Resolução que regulamenta a coordenação e dispõe sobre as regras de alocação e monitoramento do uso da infraestrutura aeroportuária vai definir como serão alocados os slots deixados pela Avianca Brasil, que haviam sido distribuídos de forma temporária entre as companhias aéreas quando a empresa se retirou do mercado.
A coordenação de slots faz parte de uma política adotada em todo o mundo no gerenciamento de aeroportos muito movimentados e visa garantir o máximo da eficiência da infraestrutura aeroportuária. Quem define as regras de coordenação é a IATA (Associação Internacional de Transportes Aéreos) por meio do manual WSG – Worldwide Slot Guidelines (Diretrizes Mundiais de Slot), que classifica os aeroportos em 3 níveis.

Veja abaixo como são distribuídos os slots e os principais pontos da minuta da Anac:
Nível 1 – aeroporto não coordenado
A capacidade e infraestrutura aeroportuária são adequados para atender demanda dos usuários. As companhias aéreas e aeroportos conseguem coordenar sozinhos as operações.
Nível 2 – aeroporto facilitado
Há a possibilidade de esgotamento da capacidade e infraestrutura em determinados horários do dia e/ou períodos do ano. Cabe ao administrador do aeroporto nomear um facilitador para coordenar os slots nas sazonalidades.
Nível 3 – aeroporto coordenado
Aeroporto com capacidade e infraestrutura saturadas. Como companhias aéreas e aeroporto não conseguem coordenar sozinhos as operações, o governo nomeia um coordenador independente para manter a eficiência e o equilíbrio entre o número de voos ofertados com a infraestrutura aeroportuária disponível.

A proposta de Resolução cria o Nível 4 – aeroporto coordenado saturado
“Aeroporto cujo nível de saturação da capacidade aeroportuária comprometa qualquer um dos componentes críticos (pista, pátio ou terminal), além de possuir condições que impliquem em barreiras à entrada, com potencial prejuízo à contestabilidade do mercado e à competição efetiva, bem como em outras hipóteses previstas nesta Resolução, e que tenha sido declarado como tal pela ANAC”

Entre os pontos da proposta, há a regra para a distribuição dos slots com limite máximo de participação de mercado por empresa, de 40% dos slots por companhia. Mas a empresa que tiver direito histórico de mais de 40% não irá perder participação, embora não possa receber mais slots.
O texto regulamenta ainda a cessão de slots entre empresas, conhecido como mercado secundário. Empresas que tenham cedido slots, entretanto, não poderão participar de nova distribuição por um período de 3 anos. A cessão de slots só poderá acontecer após período de também 3 anos com direito de uso.

Você também pode ler a íntegra do documento da Anac em https://www.gov.br/anac/pt-br/acesso-a-informacao/participacao-social/consultas-publicas/consultas/2021/19/cp-19-2021-minuta-de-resolucao.pdf

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A transferência de bens/mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular e a ação direta de constitucionalidade nº 49

A transferência de bens/mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular e a ação direta de constitucionalidade nº 49

Em abril de 2021, o STF confirmou a jurisprudência dominante e julgou improcedente da Ação Declaratória de Constitucionalidade nº 49, ajuizada pelo Rio Grande do Norte, confirmando a não incidência do ICMS sobre a transferência de bens/mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular.

Cabe lembrar que até súmula do STJ já tinha sobre a matéria (súmula 166), porém os Estados mantinham a cobrança ilegal e inconstitucional, pois a matéria não havia sido decidida em sede de controle concentrado de constitucionalidade, ou seja, os dispositivos legais não haviam sido declarados inconstitucionais.

Em razão do julgamento da ADC 49, esse argumento não cabe mais, porém a “inconstitucionalidade útil” parece ser justificada, pois a modulação dos efeitos da decisão permanece sendo discutida e, por incrível que pareça, o contribuinte pode ser o prejudicado.

Ocorre que a maior parte do mercado havia se adaptado à cobrança e não discutia a matéria, pois a saída da mercadoria para estabelecimento do mesmo titular, embora sujeita à incidência do ICMS, dava o direito ao crédito no estabelecimento de destino. Ou seja, o crédito anulava o débito e, com isso, os grandes contribuintes preferiam não se indispor e seguir as regras impostas pelos estados.

Com a declaração de inconstitucionalidade, surge o receio dos créditos serem glosados, pois a operação não sujeita à incidência do ICMS não dá direito a crédito.

E aí?

Em decorrência disso, os embargos de declaração pedindo a modulação dos efeitos ganhou apoio das grandes empresas que contribuíram para esse efeito cascata, pois temem perder os créditos gerados.

Ficamos na espera de uma decisão do STF que não prejudique os contribuintes que optaram por discutir as cobranças e não recolher o ICMS, seja na esfera administrativa ou judicial, pois a modulação de efeitos de forma inadequada pode validar a cobrança inconstitucional e ilegal realizada até o início da vigência da decisão.

Douglas Ayres | Especialista em Direito Tributário, advogado de Di Ciero Advogados

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Reflexões sobre o julgamento RE666.094-DF: A necessária harmonia entre o público e o privado nas ações e serviços de saúde

Reflexões sobre o julgamento RE666.094-DF: A necessária harmonia entre o público e o privado nas ações e serviços de saúde

No dia 30/09/2021, o Supremo Tribunal Federal julgou o Recurso Extraordinário 666.094-DF, fixando regras para pagamento de serviço hospitalar, imposto por força de decisão judicial.

A importância do tema mereceu o tratamento sob o regime de repercussão geral, possibilitando a manifestação de entidades interessadas (amicus curiae) sobre o mérito da causa, tendo o resultado do julgamento sido alcançado por unanimidade.

O caso diz respeito à ação de cobrança ajuizada por empresa de seguro de saúde privado objetivando o ressarcimento, em face do Distrito Federal, dos custos de serviços médicos urgentes prestados em favor de pessoa física, não beneficiário de assistência médica complementar e sem vaga no atendimento da rede pública, por força de decisão judicial.

A questão sob julgamento, assim, opôs, de um lado a empresa de serviços de saúde, reclamando pelo ressarcimento dos serviços prestados pelo preço ordinário por ela praticado no mercado; e, de outro lado, o ente público, pugnando pela remuneração dos serviços, mas pelo preço de remuneração dos hospitais privados credenciados pelo SUS (i.e. “Tabela SUS”), evitando distinções sem amparo em lei.

Concluiu o Supremo Tribunal Federal, finalmente, por unanimidade, pelo acolhimento da tese defendida pelo Distrito Federal, estabelecendo que “o ressarcimento de serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do Sistema Único de Saúde, em cumprimento de ordem judicial, deve utilizar como critério o mesmo que é adotado para o ressarcimento do Sistema Único de Saúde por serviços prestados a beneficiários de planos de saúde”.

O voto do eminente Ministro Roberto Barroso, que foi acompanhado por todos os demais membros do Tribunal, está à altura do assunto, pela excelência de sua fundamentação, suscitando, como natural consequência, significativas reflexões que transcendem a seara jurídica, tocando questões fundamentais sobre nossa sociedade, a gestão pública de serviços e recursos e o próprio papel do Estado.

Sob a perspectiva jurídica, podemos afirmar que o julgamento faz refletir sobre a garantia da livre iniciativa, a tensão entre os regimes público e privado, entre a política e o direito, segurança jurídica, judicialização, direitos fundamentais, dentre outros. E nesse contexto fértil à reflexão, pretendemos destacar duas questões suscitadas pelo julgamento, a saber: a excepcionalidade paradoxal da conclusão e os caminhos para sua superação.

O voto no Ministro Barroso é claro em identificar, no caso, uma tensão entre a garantia da livre iniciativa e da propriedade privada, de um lado, e as prerrogativas do poder público para a intervenção na propriedade privada, de outro. Também não deixa dúvidas de que a medida judicial determinada está apoiada em regra jurídica expressa e veiculada em lei (Lei 8.080/1990, art.15, inciso XIII), esclarecendo sua finalidade de atender necessidades coletivas, urgentes e transitórias, decorrentes de situações de perigo iminente, afastando o contraponto do ativismo judicial.

A questão é que há o risco de a exceção tornar-se regra, ante a omissão histórica da política institucionalizada em solucionar o problema, revelando um paradoxo e naturalizando-se a impossibilidade de cumprir harmonização entre os setores público e privado na prestação dos serviços de assistência à saúde, tal como proclamada constitucionalmente (arts. 196, 197 e 199). É possível deduzir dos fundamentos do julgamento esse apelo, pois que a judicialização da questão, nessa perspectiva, merece maior destaque enquanto denúncia (do problema) do que a sua solução (que, conforme evidenciado pelo julgamento, a solução transcende os limites do jurídico).

Nesse sentido, o julgamento, ao demonstrar que aplicou o direito ao caso valendo-se do recurso da analogia, evidencia que o litígio poderia ser evitado se suprida a lacuna legal mediante a edição de legislação específica, a partir do estabelecimento de procedimentos e parâmetros adequados para apuração do valor indenizatório para tais casos excepcionais. Ainda, demonstra que a causa da judicialização da questão é exatamente a mitigação, pela omissão do Estado, da garantia do direito à saúde, omissão esta que, por sua vez, justifica a intervenção estatal excepcional, concluindo, assim, um ciclo vicioso.

Concluímos, portanto, com o apelo que extraímos do aludido julgamento para que seja superada a realidade paradoxal e seus efeitos negativos e obstativos do nosso desenvolvimento, cumprindo o Estado com seu dever de prover a assistência à saúde, serviço público não privativo, inclusive provendo as condições de sua operacionalidade, com a dimensão e significado impostos pela Constituição Federal, como condição prévia fundamental para a viabilidade da atuação da livre iniciativa no setor (complementar ou suplementar).

Cid Pereira Starling | Advogado de Di Ciero Advogados nas áreas de Direito Administrativo, Direito Processual Civil, Direito Civil e Direito da Tecnologia da Informação e Comunicação.

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Carf ratifica necessidade de comprovação do fato alegado para fins de lavratura de auto de infração

Carf ratifica necessidade de comprovação do fato alegado para fins de lavratura de auto de infração

Recentemente foi proferida decisão no âmbito administrativo que ratifica a necessidade do Fisco demonstrar a prática do suposto ato ilícito do contribuinte mediante a apresentação de provas.

Na ocasião, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) lavrou auto de infração pela autoridade competente, sob a presunção de extravio através da mera informação de que a carga não teria sido armazenada. Contudo, o procedimento correto para fins de verificar a falta de mercadoria manifestada deve ser realizado através do confronto do manifesto de carga com os registros de descargas, prática essa que infelizmente não é recorrente.

Deve ser observado que inúmeras autuações de extravio são lavradas somente com base na informação de “armazenamento zerado”, sendo poucas as ocasiões em que o direito do contribuinte é reconhecido pela ausência de provas das autoridades fiscalizadoras.

Nesse sentido, novamente é possível discutir que o ônus da prova é dever do Fisco, e não se pode presumir o extravio de uma carga apenas porque ela não foi armazenada, e o consequente lançamento do Imposto de Importação (II) por este motivo é desprovido de legalidade. Este princípio também se aplica ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e ao PIS/COFINS Importação.

Deste modo, espera-se que o entendimento adotado seja parâmetro para futuras decisões sobre o assunto no âmbito do processo administrativo.

Jacqueline Lui | Advogada de Di Ciero Advogados

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Acessibilidade no transporte aéreo

Acessibilidade no transporte aéreo

Via de regra, a defesa após o ajuizamento de execução fiscal deve ser feita por meio de embargos à execução fiscal ou, quando a questão não demandar dilação probatória e se tratar de matéria de ordem pública, via exceção de pré-executividade.

Como garantir a acessibilidade de pessoas com deficiência e outros passageiros com necessidades de assistência especial ao transporte aéreo?

O Projeto de Lei 5586/2019 propõe uma alteração ao Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei nº 7.565/1986), tornando obrigatória a disponibilização de veículos adaptados com plataforma elevatória – o ambulift – que permitam que passageiros que não possam subir escadas tenham acesso à aeronave.

A advogada Nicole Villa, especialista em aviação, traz algumas considerações sobre a necessidade e a viabilidade desta regra.

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1ª Turma do STJ nega a exclusão da CPRB da base de cálculo do PIS e da COFIN

1ª Turma do STJ nega a exclusão da CPRB da base de cálculo do PIS e da COFIN

Uma das “teses filhotes” originadas da exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da COFINS, conhecida no meio jurídico como “tese do século”, parece ter chegado ao fim.

A 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou recurso que tratava da possibilidade de exclusão da Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta (CPRB) da base de cálculo do PIS e da COFINS, enquanto a 2ª Turma do STJ também já possui decisões no mesmo sentido. Com isso, as duas turmas do STJ que podem julgar a matéria possuem entendimento contrário ao contribuinte.

Por sua vez, o STF entendeu em julgamento recente que a matéria é infraconstitucional, ou seja, deve ser definida pelo STJ. Desse modo, mesmo existindo inúmeros recursos pendentes de julgamento e não tendo recurso repetitivo, a tendência é que a exclusão da CPRB da base de cálculo do PIS e da COFINS não tenha um desfecho favorável.

Douglas Domingues | Advogado de Di Ciero Advogados

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STF julga inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre a taxa Selic na repetição do indébito tributário

STF julga inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre a taxa Selic na repetição do indébito tributário

O Supremo Tribunal Federal finalizou o julgamento do RE 1.063.187/SC, afetado sob o rito da repercussão geral, e fixou a seguinte tese: “É inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário“.

O ministro Dias Toffoli, relator, lembrou que, recentemente, o STF definiu, ao julgar o tema 808, que: “Não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função“.

Com isso, o STF mantém a coerência ao reafirmar que os juros de mora visam apenas recompor efetivas perdas, sem, entretanto, implicar aumento de patrimônio do credor.

Douglas Domingues | Advogado de Di Ciero Advogados

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Brasil passa a permitir teste antígeno para rastreio de Covid-19 na entrada de passageiros aéreos no país

Brasil passa a permitir teste antígeno para rastreio de Covid-19 na entrada de passageiros aéreos no país

De acordo com a Portaria Interministerial nº 658, publicada nesta terça-feira (05/10), fica autorizada a apresentação de teste de antígeno, realizado em até 24h antes ao embarque com resultado negativo ou não detectável para Covid-19, para a entrada de passageiros aéreos no Brasil. É também possível a apresentação do teste RT-PCR, realizado em até 72h antes ao embarque, nos termos da previsão que nesse caso já constava das portarias anteriores sobre o tema.

Permanece válida a exigência de apresentação à companhia aérea responsável pelo voo, antes do embarque, de comprovante, impresso ou em meio eletrônico, do preenchimento da Declaração de Saúde do Viajante – DSV, realizado com o máximo 24h de antecedência ao embarque para o Brasil, declarando concordância sobre as medidas sanitárias que deverão ser cumpridas durante o período em que estiver no país, sendo que a falta do documento implica em sanção à companhia aérea. Além disto, não há mais restrições de voos internacionais quanto à origem, sendo permitida a entrada dos passageiros estrangeiros de qualquer nacionalidade e procedência, desde que cumpridos os requisitos da nova portaria.

Jacqueline Lui | Advogada de Di Ciero Advogados

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Convenção sobre o Crime Cibernético é aprovada pela Câmera dos Deputados

Convenção sobre o Crime Cibernético é aprovada pela Câmera dos Deputados

No dia 6 de outubro de 2021, a Câmera dos Deputados aprovou o Projeto de Decreto-Legislativo nº 255/2021 que contém a Convenção sobre o Crime Cibernético, celebrada em Budapeste, em 23 de novembro de 2001.

A Convenção sobre o Crime Cibernético é um tratado internacional sobre cibercrimes, que prevê a criminalização de condutas, prevê normas para investigação, produção de provas eletrônicas e meios de cooperação internacional, como extradição e assistência jurídica mútua, no que se refere a crimes que envolvem violação ao direito autoral, à segurança de redes e informação, pedofilia e crimes de ódio.

O texto prevê a existência de uma rede composta pelos Estados-membro, com funcionamento 24 horas por dia nos sete dias da semana, a fim de assegurar a prestação de assistência imediata a investigações ou procedimentos relativos a infrações penais ou mesmo para recolher provas eletrônicas de uma infração penal.

A adesão do Brasil à Convenção de Budapeste já vem sendo discutida há tempos, e é importante, tendo em vista a crescente escalada de aumento de crimes cibernéticos, desde o advento da rede mundial de computadores, na década de 1990.

Mesmo o texto respeitando às soberanias dos Estados signatários, preservando direitos e garantias fundamentais das partes e respeitando os interesses das autoridades nacionais de aplicação da lei, é alvo de críticas quanto à regulação da Internet e evidências digitais.

A Convenção surgiu nos países da União Europeia, está em vigor desde 2004 e já tem adesão de países fora do bloco, como Canadá, EUA, Japão, África do Sul, República Dominicana, Costa Rica, Chile e Argentina.

No Brasil, já há uma cultura de proteção de dados com a entrada em vigor da Lei Geral da Proteção de Dados (LGPD) em agosto de 2020 e com a criação de uma Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), mas ainda há muito que se discutir sobre o tratamento de dados na esfera penal e de segurança pública.

Por isso, a importância da adesão à Convenção de Budapeste, pois ela padroniza internacionalmente normas para o combate a crimes cibernéticos e inclui o país nesse ambiente de debate e esforço à proteção dos dados pessoais.

A matéria ainda será enviada ao Senado Federal para a aprovação. O projeto não vai à sanção do presidente. É transformado em lei após a aprovação duas Casas do Congresso,

Gabriella Gaida | Sócia de Di Ciero Advogados

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ESG e as novas relações de trabalho

ESG e as novas relações de trabalho

Você sabe o que é Environmental, Social and Corporate Governance (ESG)?

Atualmente muitas empresas falam sobre esse termo, em especial, aquelas que são listadas na bolsa de valores oficial do Brasil, a B3. Porém, o termo foi popularizado em 2004 com a publicação do relatório Who Cares Wins, da Organização das Nações Unidas (ONU). Na década de 1950, empresas que desrespeitavam valores sociais viam seus investimentos reduzirem. Assim, campanhas de desinvestimento direcionavam recursos para aquelas que estavam realmente engajadas e preocupadas com questões sociais, ambientais e com boa governança corporativa. Tanto os consumidores como os trabalhadores de organizações de todos os setores observam o comportamento da empresa diante tais questões, o que impactava diretamente a reputação da companhia.

Após a criação de alguns mecanismos para avaliar as prioridades da empresa, como o Índice Dow Jones de Sustentabilidade e os Princípios para o Investimento Responsável, tornaram-se imperativas no mercado regras atreladas ao ESG para mensurar negócios, investimentos, financiamentos e até mesmo bonificações de altos executivos. Assim, ao mesmo tempo em que as empresas estão gerindo as suas atividades e os riscos inerentes a ela, instituem uma excelente oportunidade de inovação, essencial aos consumidores, investidores e financiadores como norte para a tomada de certas decisões.

No entanto, a cobrança não parte somente de consumidores, mas também dos trabalhadores, sendo possível identificar um movimento de mudança das relações de trabalho. Hoje, o colaborador não está atento apenas ao efetivo cumprimento das leis trabalhistas, mas exige também responsabilidade social da empresa com relação à sua força de trabalho. Com efeito, essa mudança de paradigma está refletida em diversas ações trabalhistas recentes, em que o foco não estava no pagamento de direitos não cumpridos, mas em questões sociais e condutas éticas que cada mais vez devem ser observadas e respeitadas no ambiente de trabalho.

Podemos citar o caso de uma trabalhadora que ajuizou uma reclamação trabalhista (AIRR-607-91.2017.5.06.0012) pleiteando redução de sua jornada de trabalho em 25%, sem redução correspondente de salário. Ela era responsável pelo tratamento médico de sua filha, com de síndrome de Down, e necessitava acompanhá-la diariamente a sessões e consultas, além de realizar os exercícios e procedimentos determinados pelos médicos. A empresa se defendeu, alegando que a redução de jornada sem a correspondente diminuição de salário não encontrava amparo legal e que a companhia já mantinha diversos benefícios e programas que atendem as necessidades da trabalhadora.

A decisão proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT), e confirmada pelo Tribunal Superior do Trabalho, contudo, determinou a redução da carga horária em 25%, com direito a intervalo de 15 minutos, sem prejuízo do salário percebido. A Corte destacou que a redução da jornada de trabalho dos pais, principais cuidadores do filho com deficiência, sem prejuízo salarial e necessidade de compensação, é indispensável para garantir a máxima proteção ao menor. Foi levado em consideração, portanto, não apenas as regras trabalhistas, mas princípios constitucionais e convenções internacionais que protegem, também os direitos da pessoa com deficiência e os direitos da criança.

Outra decisão que merece destaque (0021161-22.2018.5.04.0512) foi de uma trabalhadora que, ao tomar conhecimento que estava grávida, solicitou alteração de seu turno de trabalho. Ela e o marido cumpriam a mesma jornada de trabalho, ambos no horário noturno. Como não há creches nesse período, nem a empresa disponibiliza tais serviços, ela pretendia a transferência para período diurno por questões econômicas e sociais. A empresa sustentou que não era obrigada a alterar a organização de seus turnos para atender à necessidade individual de uma colaboradora, respaldando-se, ainda, no poder diretivo do empregador e no princípio da livre iniciativa.

Você imagina qual foi o resultado da decisão? O TRT confirmou a sentença de origem, a qual garantiu à empregada o direito à alteração do turno, bem como a indenização por danos morais, ao argumento de que o poder diretivo do empregador não seria um direito absoluto a impedir o exercício de outros por parte dos empregados, especialmente do direito à proteção ao trabalho da mulher, à maternidade e à infância. Ademais, foi usado o princípio da função social da propriedade e da empresa para garantir condições dignas de trabalho, respeitando os direitos individuais, sociais e trabalhistas.

Como foi possível observar nos litígios citados, tanto os pedidos como as decisões estão fundamentadas em princípios constitucionais gerais, e não apenas aqueles vinculados à proteção ao trabalho, como ao princípio da dignidade da pessoa humana, da responsabilidade social da empresa, da proteção ao direito da criança e do adolescente, além de aplicabilidade de conceitos previstos em convenções internacionais, elevando as relações de trabalho a um novo patamar, em que o direito deixa de ser apenas do trabalhador, mas passa a ser de toda a sociedade. Nesse aspecto, vale ressaltar que a responsabilidade social da empresa é uma via de mão dupla, pois ao mesmo tempo em que dela é exigido um comportamento ético e responsável, cabe também exigir de seus colaboradores idênticos comportamentos, dentro e fora da empresa.

Nessa esteira, também temos visto diversas decisões proferidas por tribunais que confirmam dispensas e penalidades aplicadas por empresas a seus colaboradores por não estarem alinhados com seus valores éticos. Podemos citar como exemplos o caso de uma companhia aérea que dispensou o empregado por assediar mulheres em postagens em rede social, outra empresa que dispensou o funcionário por postagens machistas e misóginas e a empresa de entretenimento que demitiu um profissional por postagens inapropriadas antivacinas, negacionistas e questões sobre nazismo.

Portanto, embora a responsabilidade ambiental e governança tenham uma maior visibilidade, questões sociais de diversidade e inclusão também merecem especial atenção, principalmente dos responsáveis pelos cumprimentos desses critérios. A promoção do bem-estar social, saúde psicológica, ambiente acolhedor, possibilidade de oferecer oportunidades iguais e representatividade também devem ganhar destaque na tomada de decisões.

Diante disso, podemos concluir que empresas que já observam as regras e estão em conformidade com os critérios gerais de ESG têm uma evidente vantagem competitiva, não só no que diz respeito à reputação e à credibilidade da companhia, mas ao acesso a pessoal e capital cada vez mais qualificado. Ser uma empresa cumpridora das leis já não é o suficiente. É preciso ser responsável socialmente e, acima de tudo, ética e transparente nas suas relações pessoais, inaugurado uma nova era nas relações de trabalho.

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Rafael Inácio de Souza Neto | Advogado de Di Ciero Advogados

Isabella Luz Mendonça | Estagiária de Di Ciero Advogados

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