Recuperação Judicial

O Superior Tribunal de Justiça vem aprimorando, de forma consistente, a interpretação da Lei de Recuperação Judicial e Falências. Os julgados mais recentes revelam um movimento claro e amadurecimento da jurisprudência, com enfrentamento de questões sensíveis e, não raramente, controvertidas, como a inclusão de cooperativas médicas no regime recuperacional, os efeitos do ato cooperativo, o tratamento das dívidas condominiais e a classificação de créditos específicos.

O quadro a seguir, organizado por Vitória Oliveira, da equipe de Direito Tributário de Di Ciero Advogados, sistematiza, de forma objetiva e didática, as principais teses consolidadas nas últimas decisões das Turmas de Direito Privado, além de um tema afetado para julgamento sob a sistemática dos recursos repetitivos. Trata-se de um panorama indispensável para profissionais e estudiosos do Direito Empresarial.

Recuperação judicial de fundação de direito privado

REsp 2.036.410 – 3ª Turma – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva

Conclusão:

Fundações de direito privado, mesmo exercendo atividade econômica, não podem requerer recuperação judicial.

Interpretação restritiva do art. 1º da Lei 11.101/2005. Tema também em julgamento na 4ª Turma, com pedido de vista.

Recuperação judicial para cooperativa médica

REsp 2.183.710 – 4ª Turma – Rel. Min. Marco Buzzi

Conclusão:

Cooperativas médicas estão legitimadas a requerer recuperação judicial, conforme previsão do art. 6º, §13 da Lei 11.101/2005, incluído pela Lei 14.112/2020.

Referência à constitucionalidade declarada pelo STF na ADI 7.442 (outubro/2024).

Ato cooperativo e recuperação judicial

REsp 2.091.441 – 3ª Turma – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva

Conclusão:

O ato cooperativo não deve ser executado na recuperação judicial, afastando relação de consumo entre cooperativa e cooperados.

Considera-se que cooperados são, simultaneamente, donos e usuários.

Dívida condominial na recuperação judicial

REsp 2.189.141 – 3ª Turma – Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva

Conclusão:

Dívidas condominiais anteriores ao pedido de recuperação são concursais; posteriores são extraconcursais.

Na falência: débitos anteriores à quebra são créditos falimentares; posteriores são extraconcursais.

Crédito de representante comercial

REsp 2.168.185 – 3ª Turma – Rel. p/ Acórdão Min. Ricardo Villas Bôas Cueva

Conclusão:

O crédito de representante comercial se equipara aos créditos trabalhistas (Classe I) na recuperação judicial e falência.

Não se diferencia pessoa física de pessoa jurídica que exerça representação comercial.

Depósito elisivo na falência

REsp 2.186.055 – 3ª Turma – Rel. Min. Nancy Andrighi

Conclusão:

Admite-se o uso do depósito elisivo para afastar a quebra, mesmo quando a causa de pedir decorre do inadimplemento do plano de recuperação.

Interpretação ampliativa do art. 98 da Lei 11.101/2005.

Letra de crédito imobiliário (LCI) na falência

REsp 1.773.522 – 4ª Turma – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira

Conclusão:

Créditos de emissão de letra de crédito imobiliário (LCI) não podem ser classificados como créditos com garantia real nos processos de falência. Assim, inserem-se como quirografários (sem preferência para pagamento).

Embora lastreada em garantia, a LCI não transmite direito real ao credor.

Crédito de fundo garantidor (FGC) na falência

REsp 1.867.409 – 4ª Turma – Rel. Min. João Otávio de Noronha

Conclusão:

Créditos do FGC são quirografários na falência, sem preferênciade pagamento.

O FGC se sub-roga na posição dos credores originais, sem alteração na classificação dos créditos.

Conflito de competência e stay period

CC 196.846 – 2ª Seção – Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze

Conclusão:

Encerrado o stay period, execuções individuais podem prosseguir sobre créditos extraconcursais, sem violar competência do juízo universal.

Durante o stay, o juízo universal prevalece; após, aplicam-se regras gerais de execução, observando-se a menor onerosidade.

Competência para IDPJ na falência

CC 200.775 – 2ª Seção – Rel. Min. Nancy Andrighi

Conclusão:

O juízo da falência não tem competência exclusiva para decretar a desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ).

Aplica-se o art. 50 do CC e os arts. 133 e seguintes do CPC, não havendo regra especial na Lei 11.101/2005 que afaste a competência geral.

Honorários na impugnação ao crédito (afetação)

REsp 2.090.060 – 2ª Seção – Rel. Min. Humberto Martins (Repetitivo)

Conclusão:

Tema afetado: definição sobre cabimento de honorários sucumbenciais em impugnação de crédito na recuperação judicial e falência.

Julgamento pendente sob rito dos recursos repetitivos, tese vinculante ainda será fixada.

Vitória Oliveira | Advogada de Di Ciero Advogados