Pejotização: A importância do Tema 1389 para a jurisprudência tributária
A recente suspensão dos processos sobre “pejotização” em todo o país, determinada pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, reacende um debate crucial para empresas, profissionais e o Fisco: quais os limites legais da contratação via pessoa jurídica?
O julgamento do Tema 1.389 pelo STF promete uniformizar entendimentos e terá impactos significativos não apenas nas relações de trabalho, mas também na arrecadação tributária e previdenciária.
No artigo abaixo, Douglas S. Ayres Domingues, da equipe de Direito Tributário de Di Ciero Advogados, analisa os principais pontos em debate e diz porque essa decisão deve ser acompanhada de perto por quem atua nas áreas jurídica, contábil e de gestão empresarial.
———————————————————————————————————————————————————
Em 14 de abril de 2025, o ministro Gilmar Mendes suspendeu nacionalmente todos os processos que discutem a licitude da contratação de pessoas jurídicas para prestação de serviços até que o STF fixe uma tese de repercussão geral sobre o tema (Tema 1.389).
Tal medida decorre da multiplicidade de entendimentos, em especial na justiça trabalhista, desde que o STF entendeu pela constitucionalidade da terceirização de atividade-fim.
Através do tema 1.389, o STF pretende analisar a questão de forma ampla na esperança de pacificar a jurisprudência nos tribunais ao delimitar regras mais transparentes sobre como os casos de “pejotização” devem ser tratados e julgados.
Apesar do contexto trabalhista, a “pejotização” possui reflexo na área tributária e previdenciária, visto que, ao se organizar como empresa, a tendência é a de que um profissional autônomo, por exemplo, reduza os seus recolhimentos de imposto de renda, contribuição previdenciária e outros encargos, além do contratante também reduzir a tributação incidente sobre a folha de salários.
Em estudo encomendado pela Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de São Paulo, a Escola de Administração da Fundação Getúlio Vargas concluiu que “se os trabalhadores por conta própria que foram incorporados no mercado de trabalho após a promulgação da reforma trabalhista tivessem sido contratados como celetistas, calculamos que a arrecadação tributária teria sido pelo menos 89 bilhões superior à observada (caso fossem empregados em empresas do Simples Nacional), ou de 144 bilhões (caso fossem empregados em empresas do Lucro Real ou Lucro Presumido), considerando os valores acumulados entre 2018 e 2023. Estes valores representam, respectivamente, cerca de 6,2% ou 3,8% da arrecadação pública federal de 2023[1]”.
Tamanho impacto certamente não agrada a Receita Federal, o que resulta em um contencioso administrativo relevante no âmbito do CARF com tendência de desembocar no judiciário, visto que, assim como ocorre na justiça trabalhista, algumas decisões do CARF não seguem a orientação do STF e desconsideram contratos pelo simples fato de haver a terceirização de uma atividade-fim, de modo a exigir a cobrança de tributos que incidiriam se a contratação não fosse de uma pessoa jurídica.
Nessa linha, recentemente a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal cassou a decisão do CARF proferida no bojo do processo administrativo nº 10983.720180/2013-18[2], que havia desconsiderado contratos formalmente constituídos sob o argumento de que haveria na verdade uma relação trabalhista entre a empresa contratante e os sócios da contratada, caracterizando, portanto, a interposição de pessoa jurídica com o objetivo de dissimular a relação empregatícia, o que validaria a cobrança das contribuições previdenciárias e aplicação de multa qualificada.
A questão chegou ao Supremo Tribunal Federal via Reclamação nº 71838 e foi solucionada de forma favorável ao contribuinte, em razão do entendimento já consolidado no STF de que é lícita a terceirização de atividade-fim.
Ao julgar o tema 1.389, o STF tende a reforçar o seu entendimento já consolidado, com o desafio de redigir um acórdão que sirva para aparar todas as arestas, de modo a ser respeitado por todos os tribunais, inclusive administrativos.
[2] https://www.jota.info/tributos/stf-anula-decisao-do-carf-sobre-terceirizacao-em-atividade-fim
Douglas Ayres Domingues | Advogado Di Ciero Advogados