O desafio global de atuar de forma cada vez mais sustentável e a participação da indústria da aviação neste processo
A atividade de transporte aéreo de pessoas e cargas é essencial para o desenvolvimento das sociedades em um mundo globalizado. Nesse contexto, a indústria da aviação foi uma das mais afetadas pela pandemia de Covid-19, não tendo deixado jamais, no entanto, de cumprir com o seu relevante papel em todo o mundo, transportando profissionais da área de saúde e vacinas, por exemplo.
A partir de agora e com o início a retomada da normalidade, alguns temas voltam a ganhar destaque na indústria, sendo que os desafios na busca de uma atividade cada vez mais sustentável é dos mais importantes. De fato, apesar das novas tecnologias e da possibilidade de interação por áudio e vídeo, as pessoas ainda querem viajar, conhecer lugares novos ou revisitar velhos amigos, em especial no contexto de maior controle após uma pandemia que ainda traz consequências para todos.
Apesar do que muitos podem pensar, a indústria aeronáutica é das mais sustentáveis em comparação a outros modais em virtude da engenharia e alta tecnologia por trás da fabricação de uma aeronave, entre outros fatores. No entanto, a busca por um meio ambiente cada vez mais equilibrado permanece como desafio permanente.
O acordo setorial de sustentabilidade na aviação
A 41ª. Assembleia da OACI aconteceu entre os meses de setembro de outubro na sede da organização, em Montreal, Canadá. A agenda ambiental do setor teve relevante destaque na oportunidade, com o apelo do Conselho Internacional de Aeroportos (ACI), entidade que representa quase 2000 aeroportos em todo o mundo, para a adoção de um acordo setorial ambicioso para o combate à mudança climática. A proposta surge no contexto do Acordo de Paris, adotado em 2015, que tem como objetivo declarado apresentar uma proposta firme ao tema das mudanças climáticas.
A indústria da aviação concorda que os objetivos do Acordo de Paris passam pelo setor e pelo comprometimento com a redução ou com as emissões líquidas. E o uso de combustíveis sustentáveis, previsto no CORSIA, é, sem dúvida, um dos instrumentos que podem ser utilizados pelo setor de forma ampla para que essa meta seja alcançada
O que é CORSIA e qual sua relevância no combate às mudanças climáticas?
CORSIA – Carbon Offsetting and Reduction for International Aviation, ou ,em português, Esquema de Compensação e Redução de Carbono para a Aviação Internacional – é um programa da OACI que tem por objetivo a redução a zero e a compensação das emissões de carbono nos voos internacionais. Adotado em 2016, o CORSIA tem o objetivo de apoiar a indústria no combate às mudanças climáticas, em especial na compensação de emissões.
O Brasil iniciou o processo de monitoramento das emissões internacionais de CO2 das companhias aéreas que operam internacionalmente as rotas brasileiras em janeiro de 2019. A ANAC é o órgão responsável pela implementação do CORSIA no Brasil e sua fiscalização. A Resolução n° 496/2018 dispõe as diretrizes que devem ser cumpridas.
As novas tecnologias e os Combustíveis Sustentáveis na Aviação (SAF)
Os Combustíveis Sustentáveis de Aviação (ou Sustainable Aviation Fuel– SAF) são dos principais instrumentos para a redução das emissões de carbono e incentivo de operações cada vez mais sustentáveis na aviação. No âmbito do CORSIA, as emissões nas operações de aviação podem ser compensadas por meio de créditos de carbono ou pelo uso de combustíveis sustentáveis elegíveis para a indústria.
Nesse contexto, são dois os tipos de combustíveis elegíveis ao CORSIA, sendo o Combustível Sustentável de Aviação (SAF) e o Combustível de Aviação com Menos Carbono (LCAF), devendo ser definido o valor das emissões evitadas para cada tipo de combustível sustentável pelo uso de metodologia específica. O Combustível Sustentável de Aviação pode ser produzido a partir de insumos orgânicos, em substituição aos combustíveis fósseis, como por exemplo aqueles produzidos a partir de óleo de cozinha usado ou ainda de resíduos agrícolas, implicando em menos emissões de CO2 no meio ambiente.
A adoção dos combustíveis sustentáveis, no entanto, impõe inúmeros desafios à indústria. O primeiro deles é relacionado à segurança, prioridade absoluta da aviação. Um outro desafio é oferecer ao mercado combustíveis economicamente viáveis, em quantidade suficiente para suprimir a demanda e manter os valores regulados. Para isso, é preciso que haja políticas públicas de incentivo ao florescimento de toda a cadeia de produção de combustíveis sustentáveis, sobretudo em países potencialmente produtores das matérias primas elegíveis, como o Brasil. Por último e não menos importante, é necessário que se desenvolva na indústria um ecossistema favorável à produção de aeronaves movidas a combustíveis sustentáveis e à adaptação dos aeroportos para esta nova realidade.
Sustentabilidade ambiental como desafio global e de toda a sociedade
É sob este aspecto que todos precisamos entender a nossa participação na busca por um meio ambiente mais equilibrado. Apenas a título exemplificativo, sabe-se que os automóveis são considerados os principais emissores de gases poluentes na atmosfera das cidades de forma geral, problema que é ainda mais significativo quando considerado o uso de veículos à diesel e que mais de 30% da frota de um município tem mais de 20 anos de uso. De acordo com o IBGE, de 2021, havia mais de 8.000.000 de veículos em circulação na cidade de São Paulo.
Trata-se de questão que precisa ser necessariamente enfrentada como premissa sinequa non na busca por uma sociedade mais equilibrada do ponto de vista ambiental. Essa questão vem sendo parcialmente desafiada a partir do uso das novas tecnologias pelas montadoras, como no caso dos carros elétricos. O uso de automóveis elétricos é um desafio por si só em razão do alto custo que, ao fim, é imposto ao usuário do veículo; e nesse contexto o equilíbrio já na produção do veículo e baterias deve ser considerado. Além disso, os veículos elétricos são, por sua vez, também poluentes, ainda que talvez em menor escala e dependendo do paradigma, já que o recarregamento constante do veículo é necessário, atividade que causa danos ao meio ambiente, o que deve ser analisada em comparação com um veículo novo e abastecido com etanol, por exemplo.
É certo, por outro lado, que o transporte aéreo, em si, envolve apenas uma pequena parte do processo de transporte de pessoas e cargas. Os desafios por um meio ambiente mais equilibrado passam pelo planejamento de fabricação de uma aeronave ou de uma turbina, por exemplo. Ainda mais, passa pelo planejamento de uma viagem internacional para fins de trabalho ou turismo, e prossegue na data da viagem e após, em vista da necessidade de ida ao aeroporto e considerando o meio de transporte utilizado para esse fim e outros elementos.
É importante, dessa forma, que o desafio em busca do meio ambiente sustentável na aviação seja reconhecido como um desafio coletivo e que todos sejam envolvidos nesse processo. A boa notícia é que já é possível fazer muito para que essa realidade seja melhor vislumbrada no curto prazo e desenvolvida em benefício das futuras gerações.
Paulo Stipsky | Sócio de Di Ciero Advogados
Vitória Raizaro | Advogada da equipe de Direito Tributário de Di Ciero Advogados
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