Nova lei pode transformar trabalhadores por aplicativos em acionistas

Uma proposta da SEC (sigla em inglês utilizada para a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos) pode transformar os trabalhadores de aplicativos em acionistas dessas empresas. O objetivo é proporcionar melhores condições de trabalho através do fornecimento de ações aos colaboradores dessas novas gigantes da tecnologia.

Esta não é uma mudança simples e o órgão americano já havia rejeitado uma proposta semelhante em 2019. Desta vez, porém, o resultado pode ser diferente, já que a SEC se mostra mais inclinada a propor a alteração nas regras trabalhistas dos gig workers, como são chamados os profissionais que atuam com serviços disponibilizados por aplicativos.

O Rule 701, um programa-piloto que vai testar durante 5 anos novas relações de trabalho dos profissionais com plataformas digitais, indica a possibilidade de que as companhias cedam ações para os trabalhadores. Há um limite de 15% do valor da remuneração recebida durante os últimos 12 meses. O valor da bonificação também não pode ultrapassar 75 mil dólares em um período de 36 meses.

Ao longo dos últimos anos, empresas como Uber e Lyft, além de companhias com forte presença no Brasil, como 99, iFood e Rappi estão sendo criticadas pelas baixas remunerações e ausência de benefícios aos profissionais que utilizam estes apps como fonte de renda. Para as plataformas, esta seria uma forma de compensar os trabalhadores autônomos sem realmente ter que desembolsar dinheiro.

A proposta ainda precisa passar pela avaliação pública, em que qualquer pessoa pode comentar sobre o assunto, durante um período de 60 dias para propor mudanças.

Supondo que seja aprovado nos Estados Unidos, possivelmente os reflexos serão experimentados pelos quase 45 milhões de brasileiros cadastrados em plataformas (dados colhidos antes da pandemia do coronavírus) que utilizaram alternativas proporcionadas pelas inovações da economia digital para obter o sustento.

A legislação do Brasil é diferente da que existe nos Estados Unidos, mas uma vez aprovada a proposta da SEC, poderemos ver mudanças aqui em nosso território.

É fato que as Big Techs, como costumam ser chamadas as empresas de tecnologia, em algum momento, foram consideradas Startups. Elas surgiram principalmente no Vale do Silício, região que atualmente é considerado o maior polo de inovação do mundo, localizada na parte sul da região da Baía de São Francisco, na Califórnia, Estados Unidos. O segredo de tanta inovação não é a localização, mas sim a diversidade de pessoas.

Na verdade, toda a empresa criada no Vale, nasce com a intenção de ser global, em um ambiente de incertezas, quebrando paradigmas, mudando a economia e oferecendo produtos e serviços para todo o planeta. E não existe a possibilidade de ser global sem ser diverso desde princípio.

Por consequência, as regulamentações chegam sempre após as implementações. Aliás, recentemente o governo federal levou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei Complementar 249/2020, chamado de Marco Legal das Startups, um conjunto de leis que promete facilitar a vida de empresas do gênero.

O objetivo do texto é criar pontos que delimitam bem a área de atuação das Startups, proporcionando um ambiente mais seguro juridicamente para empreendedores e para potenciais investidores. Em resumo, o Marco Legal das Startups chega para tentar desburocratizar processos que, em muitos casos, emperram o crescimento do ecossistema do país.

Podemos citar como um dos principais pontos do Marco Legal no âmbito trabalhista a consolidação do stock options, ou seja, a opções de compra de ações para funcionários de Startups, o que de certa forma tem relação com o modelo apresentados pela Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos. Inclusive, isso já é uma realidade em diversos locais do mundo.

Portanto, se por um lado o regime de contratação pela CLT é bastante oneroso para essas empresas, de outro lado a entrega de ações aos colaboradores pode ser um refresco para esses profissionais. Seria fundamental a adequação da legislação trabalhista à realidade atual, mas enquanto isso não acontece, teremos grandes debates a respeito dessa nova economia.

Rafael Inácio | Advogado Di Ciero Advogados

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