Justiça do Trabalho utiliza a tecnologia contra falsos depoimentos em ações

A Justiça do Trabalho está modernizando o treinamento oferecido aos magistrados e servidores para usar redes sociais, rastreamento por celular, mensagens em aplicativos e biometria. O objetivo principal é reduzir a grande dependência de testemunhas e evitar depoimentos que distorcem a realidade.

Os magistrados são estimulados a buscar dados em operadoras de telefonia, aplicativos, serviços de backup e nuvens de armazenamento para que provas digitais substituam oitivas – uma tradição nos processos – até das partes. Com o objetivo de evitar violação de privacidade e intimidade, diante da recente publicação da Lei Geral do Proteção de Dados (LGPD) e de outros marcos legais, é recomendado atribuir o segredo de Justiça nas ações trabalhistas. A atual legislação estabelece regras para evitar vazamentos e proteger dados pessoais. Isso, porém, não impede a captura.

A mudança de paradigma, no entanto, deverá causar debates, uma vez que altera completamente o cenário que temos hoje. A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) ainda não tomou conhecimento da estratégia. Alguns advogados alertam para os riscos da tecnologia. Essa disrupção na Justiça do Trabalho espera que as provas digitais sejam usadas na solução de processos que versam sobre justa causa, horas extras, equiparação salarial e assédio moral e sexual, entre outros temas.
O direito ao recebimento de horas extras, por exemplo, seria deferido ou indeferido com geolocalização por celular. A ferramenta poderia atestar ou descartar a permanência no local de trabalho. A biometria, usada para liberar determinados acessos, seria capaz de fornecer um controle preciso de quantos empregados entram, saem e descansam em uma empresa. Uma foto extraída de uma rede social poderia fundamentar uma justa causa.

Normalmente, o julgador, diante de depoimentos contraditórios, costuma demandar muito tempo na análise do conjunto probatório, visando assegurar se o testemunho é verdadeiro ou falso. Através das provas digitais, o juiz poderá identificar a verdade dos fatos de maneira ágil e com muito mais segurança.

No atual momento de pandemia que estamos atravessando, é nítido o acúmulo de processos em determinadas Varas do Trabalho, as quais após a reforma trabalhista de 2017 haviam diminuído. O coronavírus, além de acelerar o crescimento tecnológico em diversos setores do mundo, também forçou a realização de audiências telepresenciais, inclusive as instruções, mas o modelo ainda enfrenta resistência por parte dos mais conservadores.

Se por um lado, temos juízes inseguros com atos processuais, de outro, temos advogados que pedem adiamento de audiências de instrução (momento no qual as provas são produzidas) até que o trabalho presencial seja retomado. Entre nós, esse novo modelo, no meu entender, veio para ficar, pois os benefícios (ganho de tempo com o deslocamento e a redução significativa de custos para as partes) são maiores do que os eventuais prejuízos, os quais podem ser sanados através da diligência na condução por parte do magistrado. Esse seria um tema que facilmente renderia outro artigo.

Em suma, o uso da tecnologia no Poder Judiciário e na Justiça do Trabalho especificamente, é um caminho sem volta, considerando que as provas digitais irão acelerar os processos e reduzir a quantidade de ações. Por esse motivo, o profissional do direito, deve ficar atento para as novas tecnologias e inovações ao longo da carreira.
É fato que a idoneidade da prova pode ser ameaçada em razão de eventual orientação de testemunhas, o que é proibido. Neste aspecto, entram na mira da Justiça, informações inconsistentes colhidas através de depoimentos, as quais podem dar lugar às provas digitais.

O magistrado, no curso da instrução processual, possui ampla liberdade na condução e apreciação de provas. Se, por acaso, o juiz verificar que a prova digital é suficiente para dar fundamento à decisão, certamente ele poderá adotar apenas a prova digital, ou trabalhar com outros tipos de provas não usuais, como por exemplo, a ata notarial digital trazida no processo por uma das partes, a qual serve como prova pré-construída.

Em que pese o princípio da oralidade nortear a Justiça do Trabalho desde o início, este não será o princípio que irá levar esta Especializada para outro patamar. As provas digitais revelam fatos, discursos e práticas. Aqueles que entendem que a testemunha sempre foi a “rainha das provas”, provavelmente são as mesmas que desconhecem o poder da tecnologia e o quanto ela se mostra eficaz na solução dos litígios.

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Rafael Inácio de Souza Neto | advogado de Di Ciero Advogados

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